06 abril 2010

Confidencialidade do email do trabalhador

O artigo 22.º do Código do Trabalho, cuja epígrafe é "Confidencialidade de mensagens e de acesso a informação", dispõe:


"1 - O trabalhador goza do direito de reserva e confidencialidade relativamente ao conteúdo das mensagens de natureza pessoal e acesso a informação de carácter não profissional que envie, receba ou consulte, nomeadamente através do correio electrónico.
2 - O disposto no número anterior não prejudica o poder de o empregador estabelecer regras de utilização dos meios de comunicação na empresa, nomeadamente do correio electrónico".



Este artigo corresponde ao anterior artigo 21.º, sobre o qual recai o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 8 de Fevereiro passado.


Resumidamente, os factos prendem-se com o despedimento da autora por justa causa com base na troca de mensagens de correio electrónico.


Na matéria assente pode ler-se: "os arguidos dedicam-se a injuriar os gerentes, seus familiares e os colegas de trabalho, vem como a conspirarem em prejuízo da empresa, ao mesmo tempo que admitem desempenhar as suas funções sem o zelo e a diligência a que estão obrigados, o que é inaceitável, senão mesmo chocante!" (sic).



O acórdão dá provimento à posição de Joana Vasconcelos, citando-a: "A nossa lei garante, sem mais, o direito à reserva e à confidencialidade de quaisquer mensagens de natureza pessoal – cartas, faxes, correio electrónico, sms, telefonemas, etc. – que o trabalhador envie ou receba no local de trabalho, ainda que utilizando meios de comunicação pertencentes ao empregador. As mesmas reservas e confidencialidade são asseguradas relativamente a informação não profissional que o trabalhador receba ou consulte – por ex., via Internet – no local de trabalho". Referindo-se aos factos constantes do processo, o tribunal conclui: "há que qualificar a mensagem enviada pelo e.mail como de natureza pessoal (ou privada) – não profissional, portanto – e, como tal, submetida, em princípio, à previsão do art.º 21º do CT.Na verdade, tratou-se, como o teor do mail revela claramente, de uma vulgar comunicação entre 2 amigas, (…) em que não se veicula ou se pede ou está em causa qualquer informação de serviço ou outro aspecto que se ligue à execução de qualquer das prestações inerentes à execução do contrato de trabalho, por parte quer da autora, quer da destinatária, Dr.ª DD, ou qualquer assunto atinente ao processo produtivo ou comercial da empresa".

Não chegaria ao ponto de afirmar que a comunicação em causa terá sido uma vulgar comunicação, mas parece a solução mais acertada entendê-la como "não profissional" (como exige o artigo do Código do Trabalho em questão). E, dessa forma parece ter estado bem o tribunal ao aplicar à situação a reserva de confidencialidade que lhe era devida.

Em suma, o tribunal considerou "o conteúdo dessas mensagens que a Ré transcreve e imputa ao A., não tem natureza profissional, estando o seu acesso coberto pelo direito, nos termos das disposições legais citadas, à confidencialidade, o que impede, perante a falta de autorização do A., quer o acesso, pela Ré, ao seu conteúdo, quer a sua divulgação a terceiros e, por consequência, impede também que sobre a factualidade em questão seja produzida prova, mormente testemunhal, que, a ter lugar, seria nula", concluindo que "O conteúdo das mensagens, de natureza pessoal, enviadas ou recebidas pelo trabalhador, ainda que em computador da empresa, estão abrangidas pelo direito de reserva e confidencialidade consagrado no art. 21º do Código do Trabalho (2003) não podendo, em consequência e sem o consentimento do trabalhador, ser utilizado para fins disciplinares, nem produzida prova, designadamente testemunhal, sobre tal conteúdo".

Ver Acórdão do Tribunal da Relação do Porto.

Mais sobre privacidade no PITI.

1 comentário:

Anónimo disse...

Vimos portanto que qualuer trabalhador pode, dentro ou fora do seu horário de trabalho, prejudicar gravemente uma empresa, pondo em risco diversos aspectos do seu desempenho e do futuro da mesma bem como de outros colaboradores que talvez existam. Leis como esta fazem com que cada vez mais empregados vejam a empresa como o "alvo a abater" para gozarem do tão aguardado subsídio de desemprego. A ideia é portanto, abate ás empresa, sim ao subsídio.