27 novembro 2008

3 avisos (em Portugal)... não obrigado.

Vem de há muito a oposição deste blogue à doutrina dos 3 avisos (three strikes and you're out), ver aqui.
Sem querer ser repetitivo: esta não é a melhor opção para a Europa e não o será para Portugal.

Um breve resumo sobre o tema:
Numa palavra, a opção pelos 3 avisos prende-se com a responsabilização do ISP (internet service provider), e materialização deste como 'polícia da internet'. Assim, defendem alguns, o ISP deverá atentar aos downloads efectuados pelos utilizadores e avisar aqueles que alegadamente possam estar a infringir direitos de propriedade intelectual. Aqueles que alegadamente continuem a efectuar tais downloads deverão ser avisados uma segunda vez, ou em alternativa será o serviço interrompido temporariamente. Por fim, o terceiro aviso prender-se-á com o bloqueio do acesso à internet.

Esta teoria vê a sua mais profunda aplicação em França, sendo que (felizmente) o Parlamento Europeu se tem vindo a mostrar contra esta opção legislativa, posição reiterada por deputado europeu em resposta ao PITI. De reparar que a aprovação do pacote telecom trouxe algumas dúvidas, logo desfeitas, quanto a uma possível entrada por portas travessas da opção dos 3 avisos.

3 avisos 'chega' a Portugal
Surgiu em Portugal um "Movimento Cívico Anti-Pirataria na Internet" denominado MAPiNET. Este surge sob a alçada da Acapor (Associação do Comércio Audiovisual de Portugal).
Este movimento defende, como se afere da notícia do PÚBLICO e da apresentação em que a MAPiNET afirma a sua posição quanto ao afastamento da emenda 138 do Pacote Telecom (que exige intervenção judicial para o corte do acesso à internet).
Não vou discutir a veracidade de números ou impactos de downloads na indústria, debate que podem seguir no Conversas do Bruno. Vou-me limitar a abordar a opção dos 3 avisos, objectivamente considerada.

3 avisos, não.
A protecção dos direitos de propriedade intelectual é fundamental numa sociedade do conhecimento como é a nossa. Porém, a protecção da liberdade e outros direitos fundamentais não pode ser posto em causa.
O PÚBLICO dá conta que "Esta solução implica a colaboração dos fornecedores de acesso, que são normalmente acusados pelos defensores dos direitos de autor de não quererem restringir ou vigiar a utilização das ligações que vendem para não afastar clientes. Os fornecedores de acesso, defende o manifesto do MAPiNET, “têm colhido frutos do facto de a tecnologia que disponibilizam permitir que se partilhem ficheiros de forma ilegal”. A BRISA também colhe frutos pelo facto das auto-estradas possibilitarem andar a 200km/h, e no entanto não queremos a BRISA a condenar condutores - queremos a polícia a fiscalizar e o tribunal a condenar. Está aqui um príncipio básico de separação de poderes, e a não aceitação da justiça privada.
Será aceitável uma empresa privada (que mediante uma opção dos três avisos não tem opção, passa a ter o ónus de vigiar) a cortar o acesso à internet baseado em alegados downloads ilegais?
Para haver um corte, medida tão drástica, terá de haver intervenção judicial. Além disto, feliz ou infelizmente não há filtros para separar os downloads legais dos ilegais.

Eu oponho-me de forma veemente à "Great FireWall of China". Não me considero libertário da internet - esta tem de ser regulada.
Estes dois extremos têm de ser balançados. A internet provocou um grande avanço para vivermos na Sociedade do Conhecimento. O Direito à Informação é um Direito Fundamental.
Não podemos querer utilizar esta ferramente fundamental, cuja democratização custou tanto a obter (e é ainda uma luta), para colocar vigilantes nos nosso acesso à informação.

Os 3 avisos não devem ser opção. Está na altura da indústria ser mais criativa, e perceber o mundo em que vivemos - nunca deixando de fazer valer os seus Direitos de Propriedade Intelectual.

Para terminar, como referi aqui:
"Uma família utilizará o mesmo acesso de internet para trabalhar, pesquisar, home-banking, jogar, socializar ou tirar músicas da internet. Por muito presente que esteja o download ilegal na utilização da internet, o corte geral de este acesso mostra-se como uma medida excessiva e não justificável face a todos os usos que dela se fazem."

Dados pessoais
Questão final, não menos importante, afirma Paulo Santos, segundo o PÚBLICO, que não se deveria confundir "dados de tráfego (informação que ajuda à identificação de um determinado utilizador da Internet) como dados pessoais".
Segundo a Directiva 95/46/CE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 24 de Outubro de 1995 relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, no disposto no art. 2.º constitui dados pessoais "qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («pessoa em causa»); é considerado identificável todo aquele que possa ser identificado, directa ou indirectamente..."

Face a isto, defendo que o IP (internet protocol) que funciona como endereço de um acesso à internet, constitui-se como dado pessoal; e, como tal, deverá gozar das protecções a esse estatuto inerentes.

Mais, sobre 3 avisos no PITI.
Notícia no PÚBLICO.
Notícia do MAPiNET.
Discussão no Conversas do Bruno.

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